Enquanto o resultado final pode ser o mesmo (uma tremenda mordida em quem se atrever a estar por perto), a agressividade em cachorros tem origens bastante diferentes. Na verdade a agressão nem sempre é demonstrada na forma de mordida. O cachorro pode demonstrar comportamento agressivo através da postura do corpo, rosnados e latidos entre outros. Além disso, a agressão pode ser ofensiva ou defensiva.
Embora nós humanos tenhamos o costume de classificar o comportamento agressivo dos cães como simples e pura maldade, a agressão em sí não está relacionada com nenhum sentimento de raiva nestes animais. Cães mordem, atacam, ou ameaçam outros seres para defender seu território, sua posição hierárquica, sua comida, para garantir suas chances de cruzar com uma fêmea e perpetuar a espécie, por medo, para proteger os filhotes ou para caçar. A escolha cuidadosa do filhote, a socialização, e o treinamento de obediência básica são as melhores ferramentas para se evitar este tipo de problema. A forma mais comum de agressão de cães domésticos contra seus donos é justamente por dominância. Dominância, que na maioria das vezes, é desenvolvida sorrateiramente, sem que os donos percebam os erros que estão cometendo e os riscos que estão correndo. Para entendermos melhor os principais tipos de agressão em cachorros vamos pedir ao Rex que nos dê alguns exemplos práticos.
Agressão por Dominância – Cachorros são animais sociais e nenhum deles, inclusive Rex, esperam igualdade. Para Rex o importante é saber qual é a posição hierárquica de cada um da família em relação aos outros, e a própria posição dele. Se Rex perceber que ninguém exerce a liderança do grupo, ou exerce sem firmeza e consistência, ele (Rex) terá o maior prazer em ocupar esta posição. Se, ao contrário, Rex entender desde cedo que todos os membros da família humana dele são mais importantes hierarquicamente que ele, nosso amigo peludo ficará mais do que feliz.
A liderança da matilha não é trabalho fácil para um cachorro. Sendo o líder, Rex não pode descansar um minuto. Ele será o responsável pela guarda e proteção de todos os membros do grupo. Será responsável por vigiar o território e, o mais importante, será responsável por manter todos os membros do grupo (você e a sua família) em seus devidos lugares. Ele não irá aceitar desafios e insubordinação (tais como acordá-lo da sonequinha, tirá-lo, ou simplesmmente sugerir, que ele saia de onde estiver, chegar perto da pessoa preferida dele, passar perto da comida ou da cama dele mesmo que ele não esteja lá, ou simplesmente ficar de pé ao lado dele e encará-lo nos olhos) sem que haja consequências. Algumas vezes Graves Consequências!!!
A maioria dos casos de agressão por dominância ocorre em machos, e aparece pela primeira vez entre dois e dois anos e meio de idade. Algumas raças e alguns cachorros possuem a predisposição genética para a dominância. São aqueles que, desde muito pequenininhos, resolvem botar os dentinhos de fora. Se corrigidos a tempo e propriamente, estes cachorros desistem de ser o líder, mas vez por outra podem tentar medir forças novamente com você.
Existem cachorros que são mentalmente dominantes e fisicamente submissos. É o caso de Bingo, um cachorrinho Toy, primo de Rex. Bingo adora ser acariciado, escovado, carregado no colo….mas só quando ele quer! Qualquer pessoa errada, ou no momento errado e ZAP! É dente pra todo lado. Além disso Bingo sabe como virar de barriga para cima, se encolher todinho ou começar a ganir como um louco para ninguém ameaçá-lo de punição. Se alguém segurá-lo firme e de forma autoritária, ele fica quietinho e treme todo, mas assim que o incauto e abusado afrouxar um pouquinho….ZAP, ZAP, ZAP (ha ha ha ha), mais um monte de mordidas!!!!!
Agressão por dominância é coisa séria e deve ser tratada o mais cedo possível. Treinamento de obediência básica costuma prevenir este tipo de problema, já que cachorro e dono estarão se comunicando e reforçando a liderança do dono. Uma vez que o problema já exista, o melhor é procurar ajuda profissional para fazer o seu cachorro desistir da posição de líder e aprender a apreciar a vida mansa de um membro inferior na hierarquia do grupo.
Agressão por Possessividade e Competitividade – Este é o tipo de agressividade mais comum entre cachorros do mesmo sexo e mesmo tamanho físco, que moram na mesma casa. Também é, normalmente, o tipo que ocorre nos cachorros com relação às crianças da família. Diferente da agressão por dominância, este é tipicamente um assunto entre “irmãos”.
Quando Rex tinha dois anos, seus donos resolveram que seria uma boa idéia comprar outro cachorrinho para lhe fazer companhia. Foi então que Roover entrou na vida dele. No início Rex achou que aquela bolinha de pelos não passava de uma peste, mas com o tempo, Rex redescobriu os prazeres das brincadeiras dos filhotes. Todos felizes e vivendo harmoniozamente, até que um dia…..
Quando Rex tinha aproximadamente 4 anos e Roover 2, mal podiam ficar perto um do outro. A cada minuto era uma nova briga e a cada dia mais violenta. Os donos de Rex e Roover não sabiam o que fazer. Rex que sempre fora um cachorro manso estava insuportável, e o pobre Roover, quase sempre levava a pior. Todos corriam para separar a briga e tentar proteger Roover.
-“Dá um brinquedinho para o Roover, coitadinho”.
-“Faz um carinho no Roover, o pobrezinho:.
-“Rex é muito feio! Rex mau, mau, mau, mau!!!!”
Mesmo sem saber, os donos de Rex e Roover estavam fazendo tudo errado. Na verdade eles estavam fomentando ainda mais as brigas entre os cachorros. O que ocorre é que Rex sempre fora hierarquicamente superior a Roover e por isso eles não tinham problemas. Quando Roover ingressou na idade adulta, idéias começaram a rondar a sua cabeça e uma vozinha lá do fundo dizia: “Vai, pega o posto do Rex, você pode! Vê, meus donos sempre me dão atenção primeiro, sempre me dão comida primeiro, os brinquedos melhores…. O Rex já era! Sem dúvida nenhuma meus donos querem que eu ocupe uma posição mais elevada. Agora é só mostrar ao Rex quem é que manda!”
Enquanto isso, do outro lado do jardim, Rex confabulava: “Quem esse fedelho do Roover pensa que é? Só porque ele está meio crescidinho acha que vai me derrubar? Eu sou o mais importante, sempre fui! Afinal, quem é que dorme mais perto dos donos? Quem passa primeiro pela porta quando vamos sair? Quem é o primeiro a ser escovado? EU! EU! EU! Eu mostro a esse pirralho com quantas dentadas se morde uma orelha!”
Já desesperados, Os donos de Rex e Roover resolveram procurar um profissional que explicou o que estava acontecendo e como corrigir o problema. Quando eles entenderam que para acabar com as brigas o melhor seria reforçar a posição mais elevada de Rex, tudo ficou resolvido e a paz voltou a reinar. Às vezes, para acabar com as brigas em definitivo, é preciso “passar” a posição mais
O mesmo cuidado deve ser tomado em relação a cachorros e crianças, especialmente quando moram na mesma casa. Para os cães as crianças são como irmãos, com quem precisam disputar uma posição. É muito importante que os adultos reforcem a posição das crianças como superiores (crianças são SEMPRE superiores) e nunca deixem sem supervisão crianças abaixo de 6 anos de idade junto de cachorros. Vale lembrar também, que é muito importante as crianças aprenderem desde cedo como tratar um cachorro com gentileza e respeito.
Agressão por Medo – Ao contrário da agressão por dominância, o cachorro morde e ataca por medo e submissão excessiva. É um tipo de agressão comum em cachorros que foram pouco socializados quando pequenos e que estranham tudo o que é novo. Também acontece com frequenência em cachorros que são maltratados ou que sofreram algum tipo de trauma.
Rex tinha um amigo que morava na mesma rua, o nome dele era Pincel. Embora Rex nunca tenha visto Pincel virando nehuma lata, diziam que ele era um belíssimo vira-lata. Pincel tinha uma vida livre e sempre ficava solto pela rua, passeando, cheirando os postes e visitando os cães da vizinhança. Pincel era muito manso e nunca se meteu em encrencas. Um belo dia, quando Pincel foi correndo ver quem era a nova cachorrinha que passeava do outro lado da rua… PAU, CRASH, BUM, TUMB! Pincel foi atropelado!
Graças ao pronto atendimento dos vizinhos que o levaram correndo para o veterinário, Pincel sobreviveu, mas nunca mais foi o mesmo. Não, ele não ficou com nenhuma sequela física do acidente. Simplesmente Pincel tomou horror de carros e pessoas (afinal aquela gente que o carregou pela rua abaixo causou um bocado de dor). Acabaram-se os dias livres para Pincel. Desde o acidente ele não pode mais sair à rua, pois se alguém chegar perto dele, ou se passar um carro, Pincel fica aterrorizado e morde tudo o que estiver por perto.
Nem sempre as causas são tão trágicas, (Rex já ouviu falar que no apartamento 604 tem um Yorkshire que não pode ver vassoura que morde todo mundo! E o Cocker do 901?! Quando ouve um trovão se mete debaixo da cama e se alguém tentar tirá-lo de lá…Salve-se quem puder!), mas o motivo da agressão é sempre o mesmo. Estes cachorros estão com medo e estão tentando se defender.
Mais uma vez o melhor é prevenir expondo seu filhote a diferentes ambientes, pessoas, sons, equipamentos, e sempre tornar essas experiências prazeirosas. Quando o cachorro já apresenta sinais de agressividade por medo, o melhor é procurar um profissional para identificar a fonte, ou fontes exatas do medo e estabelecer um cuidadoso programa de dessensibilização, caso contrário o problema pode se tornar ainda pior.
Nunca conforte um cachorro com medo. Além de você estar se arriscando a levar uma mordida, vai estar recompensando o medo e, portanto, incentivando o cachorro a se portar desta maneira.
Agressão por Proteção Territorial ou Maternal – A agressão territorial é geralmente apreciada pelos donos e muitas vezes estimulada. Embora seja uma ferramenta valiosa para a guarda de nossas residências e propriedades, a agressão territorial pode estar associada com dominância ou medo e pode se tornar um perigo se estiver fora de controle. Pirata, outro amigo de Rex, é um Pastor Belga que pelas próprias características genéticas da raça sempre foi um bom cão de guarda. Ninguém estranho podia passar perto da casa e Pirata logo dava o alarme. Aos poucos Pirata foi ampliando o que ele considerava como “sua” propriedade. Entre outras coisas, a dona dele passou a ser uma preciosidade a ser defendida, principalmente daquele arrogante chamado MARIDO!
Um dia chegou na casa uma Mercedes preta, novinha, e Pirata se apaixonou pelo carro. Ningúem, mas ninguém, podia se atrever a tocar no carro! Foi então que o MARIDO disse: “Ah não! o Carro NÃO!” e Pirata foi transferido para “outra vizinhança” (essa expressão causa arrepios em Rex). A proteção territorial pode ser de pessoas, lugares da casa, brinquedos, panos, ou literalmente qualquer coisa. Embora seja mais comum em certas raças (Pastores, Rottweilers, Terriers), a agressão por proteção territorial não é exclusiva de raças, sexo ou tamanho dos cachorros.
Já que a maioria das pessoas que possuem cachorros desejam algum tipo de proteção, é aconselhavel que se faça um curso de treinamento básico de obediência para que se possa ter controle da situação e ensinar ao cachorro a manter-se calmo quando os donos estão em casa, por exemplo.
Por incrível que pareça, a agressão por proteção maternal é mais comum em fêmeas que não possuem filhotes do que nas que acabaram de parir. Este tipo de agressão está relacionada com um hormônio que precede o cio, chamado progesterona. Sua produção se estende por dois meses na cadelas que não foram fecundadas e, para as que tiveram filhotes, por mais dois meses após o parto. Algumas fêmeas chegam a apresentar todos os sinais de uma falsa gravidez e tomam certos objetos como se fossem seus filhotes, defendendo-os como loucas. Felizmente este tipo de agressividade é passageiro!
Agressão entre Machos – Este tipo específico de agressão é muito raro ocorrer entre fêmeas. A sua origem parece estar ligada à necessidade de se eliminar a concorrência e assim garantir a propagação das características genéticas do indivíduo. São os típicos machões (por que sempre os machos, não é mesmo?). Este é praticamente o único caso em que a castração parece resolver o problema. Procuramos Rex para esta entrevista, mas ele se negou a comentar o assunto (alegou conflito de interesses)!
Agressão Predatória – Esse tipo de agressão é raro em cães domésticos e é dirigida contra outras espécies, tais como gatos, ovelhas, coelhos, etc. Muito raramente a agressão predatória vai ocorrer se o cachorro for socializado com o outro animal. Assim, dificilmente um cachorro que foi criado com um gatinho tentará matá-lo. Inclusive, este é o grande problema deste tipo de agressão. Ela significa MATAR. Algumas raças de caça são desenvolvidas com um alto grau de agressão predatória. Este é o caso, por exemplo, dos Jack Russell Terriers, uma raça que nunca se recomenda deixar sozinha com hamsters, gatos, ou qualquer outro pequeno animal. Rex nos disse que até hoje o Bife tem se comportado bem, embora ela já o tenha visto babando quando o gato do vizinho os convidou para o jantar.
Agressão por Aprendizado – Este é o caso de cachorros que são treinados para serem agressivos. Quando treinados propriamente e humanamente, estes cachorros são exemplares. Tais como cães da polícia, eles podem ser afagados por crianças e andar no meio de uma multidão sem demonstrar o menor sinal de nervosismo, mas no segundo seguinte, sob comando, são capazes de atacar e imobilizar um ladrão com a precisão de uma arma de fogo. Treinar cachorros para ataque sem que todos os aspectos de socialização, genética, e controle sejam observados é pior do que fazer uma roleta-russa. Nem todo cachorro tem o perfil necessário para ser treinado para ataque. Tanto o cão quanto o dono têm que ser equilibrados, tranquilos, sociais, inteligentes e controlados. Infelizmente nem todos têm essas características e os cachorros são abusados, maltratados e surrados para se tornarem mais agressivos. O resultado é o que a gente vê nos jornais, vez por outra, de cães que atacam o próprio dono, crianças ou pessoas que estão passando pela rua, algumas vezes resultando em morte. Ou então cachorros que são estimulados pelos donos para atacar outros cachorros ou participar de rinhas.
Segundo Rex, ele não se relaciona com este tipo de cães. Disse que não é medo, mas questão de princípios. Sei!
Agressão por Causa Desconhecida – Ainda que raros, existem casos em que cachorros se voltam contra os donos ou pessoas que eles conhecem, sem que haja nenhum motivo aparente. Quase que de uma hora para outra, estes bichinhos, sempre calmos, educados e obedientes, tornam-se perigosíssimos, rosnando, mordendo ou tentando atacar qualquer um que esteja por perto, para, no minuto seguinte, voltar ao normal.
São casos que não estão relacionados com dominância, medo, proteção, doenças ou nenhuma outra causa conhecida. A origem deste tipo de agressão parece estar profundamente ligado a genética. Algumas raças já foram diagnosticadas com esse problema que é conhecida como “Sindrome da Avalance de Ódio”. É o caso de Cães do Pirineu, do Bernese, São Bernardos, Rottweilers, Dobemans, Pastores Alemães e mais frequentemente em Cockers Spaniels Ingleses de cor loira. Isso não quer dizer que todos os cães destas raças tenham problemas. Muito pelo contrário, estes são casos raros. No entanto, deve-se ter muito cuidado e procurar saber como é o temperamento dos pais antes de comprar um filhotinho de qualquer raça.
Não existe uma cura para este tipo de agressividade. Nos casos em que os ataques são frequentes e representam perigo para as pessoas, a única solução humana é a eutanasia. Manter o cachorro preso, isolado, ou acorrentado o tempo todo é muito mais cruel.